“Moro representa um bolsonarismo sem Bolsonaro”, diz Antonio Neto

Em 10 de novembro, o ex-juiz e ex-ministro de Jair Bolsonaro Sergio Moro subiu definitivamente no palanque eleitoral ao se filiar ao Podemos e assumir a pré-candidatura à Presidência da República. Em um discurso de 42 minutos, Moro apresentou-se como um candidato com todos os predicados do establishment, em uma versão Collor 2.0. Moro, que outrora havia jurado não entrar para a disputa eleitoral, apresentou as bases de sua agenda econômica: a manutenção de tudo que aí está. Em uma fala ensaiada, pregou novas reformas liberais, o teto de gastos e mais privatizações. Em resumo, representa um bolsonarismo sem Bolsonaro.

Em seu discurso nada empolgante, o ex-ministro mostrou que sua candidatura oferece aos trabalhadores aquilo que levou o País à mais brutal precarização do mercado de trabalho, à queda vertiginosa da renda do povo brasileiro, aos mais altos índices de desemprego e à miséria pandêmica que deixa 130 milhões de brasileiros em situação de insegurança alimentar.

O “Posto Ipiranga” de Moro é o economista Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central no governo Figueiredo – na verdade, ele está mais para o “Posto Shell”. Pastore ficou conhecido por uma gestão desastrosa que aprofundou ainda mais o cenário monetário do período, marcado pela hiperinflação. Mesmo que na prática tenha fracassado, é bem-visto pelo mercado financeiro, que vai redobrar a aposta no neoliberalismo promovido por Paulo Guedes.

Consultor e um dos queridinhos do mercado, Pastore é defensor das reformas promovidas pelos últimos governos. Foi um dos maiores expoentes das mudanças na legislação trabalhista e previdenciária, além de ser um apoiador assíduo da reforma administrativa que ameaça os servidores e o serviço público brasileiro. Em suas intervenções, prega uma política de austeridade sem falar um “a” dos grandes problemas nacionais, entre eles a injusta tributação.

Ainda resta decifrar muito do que Moro propõe aos trabalhadores brasileiros. Qual o projeto para enfrentar a desindustrialização? Como combater o desemprego? Qual a política de preços da Petrobras? O que o ex-juiz pensa sobre educação? Qual reforma tributária defende? Como financiará a reconstrução nacional pós-pandemia? Qual a sua agenda ambiental?

Não é muito difícil imaginar alguns posicionamentos do ex-ministro. A reunião ministerial de abril de 2020, divulgada pela mídia, mostra um Moro muito confortável com o “passar a boiada” do ministro Ricardo Salles, com os ataques contra a democracia de Ernesto Araújo e com a visão que trata servidores como inimigos, destilada por Guedes. Se hoje o nosso país tem mais de 13 milhões de desempregados, o ex-juiz é, sem dúvida, um dos grandes responsáveis. Ao transformar o justo e necessário combate à corrupção em um espetáculo cruel de destruição de reputações, o bonde da Lava Jato promoveu a mais nefasta destruição de empresas nacionais e, consequentemente, desemprego em massa.

O combate à corrupção não é exclusividade do Brasil, mas só aqui um grupo messiânico teve poderes para destruir empresas centenárias e milhões de empregos. Os malfeitos empresariais em todo o mundo são tratados visando punir os autores dos crimes, mas protegendo os entes jurídicos – basta ver o exemplo da Nissan no Japão.

Segundo estudo do Dieese, a Lava Jato custou 4,4 milhões de empregos formais e 3,6% do PIB brasileiro. Graças ao uso político da operação, o governo deixou de arrecadar quase 70 bilhões de reais em impostos, além de ter reduzido a massa salarial em 85,8 bilhões. Esse não foi o custo do combate à corrupção, mas da espetacularização promovida por Moro, Deltan Dallagnol e a fracassada República de Curitiba.

O ex-juiz, considerado parcial pelo Supremo Tribunal Federal, não poupou esforços para fazer as entregas que interessavam ao establishment brasileiro, nem que para isso fosse necessário destruir reputações, falir empresas e implodir o emprego. Certamente, não será diferente em um eventual governo patrocinado pelo sistema financeiro, a mídia e os interesses internacionais.

Não podemos esquecer que o presidenciável do Podemos, que hoje tenta se afastar do bolsonarismo que ajudou a eleger, serviu como ministro da Justiça de Bolsonaro por um ano e quatro meses. Em total sintonia com esse desgoverno genocida e perverso, Moro tentou implementar o nefasto projeto do excludente de ilicitude, pelo qual policiais não poderiam ser punidos ao matar “sob violenta emoção”. Não é difícil imaginar, com base em todas as estatísticas de violência policial, quem seriam as principais vítimas: o povo pobre e negro das periferias. Ele ainda passou pano para as diversas denúncias de corrupção e do gabinete do ódio envolvendo Bolsonaro, a família presidencial e seus colegas da Esplanada dos Ministérios.

Não bastassem as suas contradições, pesa contra Moro a total inexperiência em um momento em que o Brasil precisará se resgatar como nação. O ex-juiz, durante o período em que comandou o Ministério da Justiça e Segurança Pública, mostrou incapacidade de articulação e uma rejeição generalizada da classe política, que ele criminalizou com a espetacularização produzida pela Lava Jato.

Os trabalhadores querem um país que transforme as suas inúmeras desigualdades em oportunidades. Oportunidades de emprego, de renda e de educação dignas. A manutenção do que aí está vai na contramão do futuro que os brasileiros um dia sonharam e, hoje, nem sonham mais diante da tragédia vivida nas ruas. Em 2022, o Brasil terá de fazer uma escolha. A escolha não deve ser resumida a uma disputa entre Luiz, Jair, Ciro, Sergio ou João, mas entre modelos. Precisamos de alguém capaz de mudar o modelo econômico e de governança que infelicitou o Brasil nas últimas duas décadas e meia. São 13 milhões de desempregados, 20 milhões de famintos, 67 milhões de cidadãos negativados e 40 milhões de trabalhadores escravos de uma precarização galopante. Moro não parece capaz de romper com esse ciclo. Nem quer.

Por Antonio Neto

Via Carta Capital

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