Juruna, Darcy, Brizola e a defesa dos povos indígenas

Nos últimos dias todo o país tem acompanhado o julgamento  da aplicação da tese do marco temporal em demarcações de terras indígenas no Supremo Tribunal Federal. Acampados em Brasília, mais de 6 mil indígenas esperam o encerramento do processo.

Se o julgamento tivesse ocorrido décadas atrás, certamente o Brasil veria um indígena no centro dessa discussão, defendendo seu povo, e com um gravador a tiracolo: Mario Juruna. Ele foi o primeiro índio eleito para o Congresso Nacional.

Juruna nasceu em 3 de setembro de 1943 na aldeia Namunjurá, na região de Barra do Garças, em Mato Grosso. Portanto, completaria 78 anos nesta sexta-feira. Mas sofrendo de diabetes e hipertensão, faleceu em 2002 devido a complicações renais e pneumonia.

Filho de xavantes, viveu até os 17 anos sem qualquer contato com o homem branco. Com a morte do pai, assumiu o posto de cacique da tribo. E no fim da década de 50, após conflitos violentos com fazendeiros da região, os Xavantes buscaram apoio na Missão Salesiana de São Marcos, também em Mato Grosso.

Mario Juruna aprendeu português e se tornou uma liderança na interlocução entre seu povo e o homem branco. Trabalhou como piloto de barco e passou a percorrer grande parte da região centro-oeste, ampliando sua visão sobre os povos indígenas e o descaso do poder público com os seus semelhantes.

O cacique começou a se destacar nos anos 1970, quando fez inúmeras críticas sobre a tentativa do governo militar de controlar territórios indígenas e privar os índios de proteções legais que eram garantidas pela Constituição.

Leonel Brizola e Darcy Ribeiro convidaram Mario Juruna para entrar na vida política. O cacique entrou no Partido Democrático Trabalhista (PDT) e venceu as eleições em 1982 para deputado federal, concorrendo pelo Estado do Rio de Janeiro. Teve mais de 30 mil votos.

O deputado federal Mario Juruna criou a Comissão Permanente do Índio — considerada um embrião da atual Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. Também conseguiu a aprovação de um projeto que alterava a composição da diretoria da Funai, que deveria ser integrada por índios ou indigenistas reconhecidos.

O gravador que ele sempre carregava consigo era para registrar as conversas com políticos e funcionários do alto escalão do governo. Caso as promessas feitas a ele não fossem cumpridas, Juruna divulgava os áudios para cobrar os políticos, que eram expostos na imprensa como mentirosos.

Mario Juruna cumpriu os quatro anos de mandato, tentou ser reeleito em 1986, mas não conseguiu. Morreu no dia 17 de julho de 2002. Ele deixou 14 filhos, de três casamentos diferentes, um livro de memórias — “O gravador do Juruna”, publicado em 1983 — e seu lugar na História como um dos maiores defensores dos direitos dos indígenas brasileiros, incluindo a demarcação de suas terras.

Cacique denunciou abusos da ditadura

Empossado como presidente do 4º Tribunal Russell, em Roterdã, na Holanda, o cacique Xavante Mário Juruna reportou, em 30 de novembro de 1980, “perseguições e assassinatos” da ditadura militar do Brasil contra povos nativos. Mesmo sem legitimidade legal, a iniciativa internacional reverberou as consequências do golpe de 1964.

“Não sei porque ‘as gentes’ sempre pisam nas tribos indígenas. Não sei porque fazendeiros são contra o povo. Será que índio não pode viver na sua terra?”, questionou o pedetista, que foi eleito, em 1982, o primeiro deputado federal indígena brasileiro.

No júri, o Xavante de Mato Grosso, que estaria completando 78 anos nesta sexta-feira (3), abriu espaço de denúncias referentes a abusos sistemáticos, inclusive para exilados. Os fatos representaram violações da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da qual o governo brasileiro foi signatário em 1948.

Como resultado do encontro, um documento final onde o Brasil foi acusado de genocídio e etnocídio, principalmente pela ampliação da invasão, tomada e expropriação de terras indígenas, bem como mortes, escravidão, racismo e violação de autodeterminação para avanço de projetos governamentais.

“Aqui eu soube que todo mundo tem o mesmo problema”, disse o pedetista, ao analisar a conjuntura repressora instalada na América Latina.

Via PDT-RJ

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